segunda-feira, 6 de julho de 2009

Modelagem Matemática como Metodologia de Ensino

Aprender matemática não significa receber todos os conceitos prontos, pois, a aprendizagem em matemática refere-se a um trabalho de pensamento de cada indivíduo para a construção desses conceitos. Assim, deve-se colocar novas situações-problema com base nos conceitos que foram construídos anteriormente, para a generalização, para a estruturação ou desestrutração do universo matemático, com vistas à compreensão e resolução de problemas, que podem ser matemáticos ou relacionados a realidade de cada indivídulo. Para isso, a atividade intelectual do aluno deve, quando possível, aproximar-se daquela feitas pelos matemáticos ou cientistas, ao longo de nossa história, ou seja, partindo de uma situação-problema, colocando suas hipóteses, testando-as, corrigindo-as, fazendo transferências e generalizando. Não podemos aceitar que a atividade intelectual do aluno seja baseada exclusivamente na memorização e na aplicação de conhecimentos, cujo verdadeira significado ou sentido não foi apropriado pelo aluno.

A concepção etnomatemática do professor no ensino–aprendizagem em matemática é a de mediador da aprendizagem, sendo portanto, uma tarefa muito mais ampla do que um simples “doador” do saber. A concepção etnomatemática do aluno nesta abordagem é a de colaborador ativo do processo de aprendizagem, tarefa muito mais estimulante do que um simples “receptor” do saber. Porém, os alunos não farão tudo sozinhos, pois precisamos organizar situações de aprendizagem que os levem à formação de conceitos, que os desafiem a procurar respostas, que dê condições para que eles se envolvam com a matemática, para que possam desafiá-la, compreendê-la e interpretá-la, tornando-a dessa forma um produto da criação humana.

Reincorporando a historicidade dos conceitos matemáticos pela Etnomatemática, refletindo sobre os processos pelos quais eles foram elaborados e demonstrando como eles se desenvolveram, devemos a partir deste momento, mostrar a presença da matemática no cotidiano de cada aluno e nos processos de desenvolvimento da humanidade, para que ela possa ser concreta, com sentido e significado, surgindo dessa maneira a motivação necessária para aprendê-la. Dessa maneira, a matemática passa a ter como objetivo a busca de explicações e maneiras de se lidar com a realidade. Assim, refletir sobre a nossa realidade passa a ser uma ação transformadora que procura reduzir o seu grau de complexidade, através da escolha de um sistema que possa representá-la. Esse sistema isolado, nos permite chegar a representações dessa realidade, elaborando estratégias que nos possibitem explicar, entender, manejar, refletir e analisar sobre este sistema. Este processo no qual se considera, analisa e faz reflexões sobre um sistema chama-se modelagem. As aplicações da modelagem se faz sempre através da realidade na qual o sistema que originou o modelo no qual efetuaremos análises e reflexões, está inserido. Devemos nos conscientizar que com a modelagem iremos trabalhar com aproximações da realidade sobre a qual estamos construindo as nossas representações. Porém, para que isto ocorra, é necessário que se faça pesquisas onde se estabeleça relações entre os sistemas e suas representações, através da análises e reflexões sobre os modelos, orientando-nos em nessa prática pedagógica.

A aprendizagem do aluno somente se torna realidade à medida que são incorporados os conhecimentos e conceitos matemáticos que serão essenciais para colaborar em sua atuação futura na sociedade, através da proposição de uma atividade pedagógica significativa e motivadora. Porém, essa incorporação não se dá com a simples adesão do professor ao trabalho proposto, pois esse programa tem por objetivo contribuir para a reflexão do aluno e para a comparação da sua própria experiência e realidade. A modelagem pode ser uma metodologia de ensino muito útil e se enquadra no programa etnomatemática, que inclui crítica, também a natureza histórica, sobre representações, que deve estar sempre subjacente ao processo de modelagem (D’Ambrosio, 1993).

O envolvimento do aluno no Programa Etnomatemática requer uma ação transformadora em seu íntimo e esta ação se manifesta quando se formulam questões e se estimulam respostas, pois elas podem instigar o aparecimento da investigação e consequentemente da modelagem, conectando os alunos com o conteúdo matemático que queremos que eles aprendam. Porém, este relacionamento não se configura no conteúdo, pois osa alunos se envolvem na questão quando eles percebem que o que estão fazendo tem algum significado para eles e, se esse significado se incorparar em seu íntimo, venceremos os obstáculos para que ocorra definitivamente esse envolvimento. Contudo, é essencial que auxiliemos os nossos alunos para que eles possam desenvolver determinadas atitudes e habilidades para o reconhecimento e a colocação de questões para eles mesmos. Dessa forma, devemos trabalhar com condições facilitadoras do envolvimento, tornando-o acessível aos alunos; deixando o ambiente propício ao diálogo, reduzindo as pressões para que as respostas sejam sempre corretas e ouvindo as suas argumentações; num clima em que os erros que possam surgir também façam parte desse processo de ensino-aprendizagem. Uma vez iniciados estes questionamentos, a modelagem se torna significativa e bons modelos podem ser elaborados e demonstrados. Dessa forma, os alunos podem aprender muito, com a aplicação da modelagem como metodologia de ensino e da etnomatemática como prática pedagógica.

Dessa forma, a modelagem pode produzir e desenvolver modelos que serão úteis para atuarem nos sistemas, podendo modificá-los através da tomada de decisão, após as devidas reflexões, discussões, análises e conclusão sobre os modelos apresentados.

Levando em consideração que todas os alunos são potencialmente ativos e que estão construindo significados que são retirados diariamente de sua realidade, não podemos desperdiçar essa energia e devemos canalizá-la para a elaboração das estruturas necessárias à construção do conhecimento matemático que queremos que eles dominem.

A Modelagem Matemática é o estudo de problemas ou situações reais como linguagem para a sua compreensão, simplificação e resolução com vistas para uma possível previsão ou modificação do objeto estudado (Bassanezi, 1994). A Modelagem Matemática como estratégia de ensino aprendizagem da matemática mostra-se eficaz pois valoriza o conhecimento e incentiva a atuação social dos alunos, enquanto que a Etnomatemática como Ação Pedagógica nos revela as potencialidades do ensino da matemática utilizando a modelagem como uma metodologia eficiente neste programa. Neste tipo de trabalho, a matemática passa a ser uma disciplina instrumental que deve ser adequadamente utilizada e desenvolvida com a utilização dos questionamentos e das inquietações que fazem parte do ambiente natural no qual os alunos estão inseridos.

A principal finalidade deste processo é desenvolver a capacidade de analisar e interpretar dados, testar hipóteses formuladas, criar modelos e verificar se eles são eficazes; dando condições para que os alunos possam entender um fenômeno e tenham condições de atuar para a sua transformação. Partindo deste princípio, a matemática deve ser vista como uma disciplina dinâmica em que o seu estudo tem uma importância fundamental, pois quando analisamos uma situação do ponto de vista matemático, o processo de ensino-aprendizagem é desencadeado, estimulando a abstração, a criação de novos instrumentos matemáticos e a formulação de novas teorias. Assim, a única maneira que temos de conduzir os alunos para a modelagem matemática, é expô-los a uma ampla variedade de problemas e a uma ampla variedade de modelos, que são interpretações matemáticas dos problemas, que por sua vez, são representações dos sistemas estudados.

A grande maioria das questões matemáticas são utilizadas para explicar ou fazer previsões sobre fenômenos que fazem parte de realidades e culturas diferentes; sendo utilizadas na representação destas situações e também para a a formulação dos modelos matemáticos necessários à sua compreensão. Porém, um modelo não significa somente um conjunto de variáveis que fazem representações qualitativas ou quantitativas sobre o sistema que será analisado. Assim, os modelos não são exatos. Então, devemos explorar todos os detalhes do modelo, examinando as hipóteses, checando as precisões, efetuando os ajustes necessários que tornem o modelo adequado e fazendo as previsões que consigam validar as hipóiteses. Não devemos abandonar os modelos porque eles são aproximados, pois em cada modelo encontramos um caminho para chegarmos a uma previsão e tomarmos uma decisão na melhoria do sistema abordado.

Podemos estabelecer uma diferença entre o substantivo modelo e o verbo modelar e como o relacionamento da palavra aprender entre eles é de suma importância. Considerando essas relções, podemos concluir que aprender um modelo consiste somente em aplicar as técnicas necessárias para solucionar os problemas matemáticos encontrados nos sistemas enquanto que aprender a modelar é um processo que procura verificar se os parâmetros que foram selecionados para a resolução dos modelos são adequados e como ocorre as implicações no interrelacionamento das seleções efetuadas nos sistemas com o estudo holístico da realidade. Não é possível explicar, conhecer, entender, manejar, lidar com a realidade fora do contexto holístico. Tem-se não mais que visões parciais e incompletas da realidade (D’Ambrosio, 1993). Dessa forma, não devemos confundir modelagem matemática com teorias ou técnicas para resolução de modelos matemáticos, pois estas podem ser memorizadas, aprendidas e posteriormente esquecidas, evitando dessa forma o desafio conceitual, o raciocínio lógico e crítico, que são essênciais ao processo de modelagem.

Modelagem Matemática: Uma Ferramenta para a Etnomatemática
Convém salientar que muitas vezes os dados obtidos na modelagem matemática são de natureza essencialmente etnomatemática., provenientes dos costumes de uma comunidade que os utiliza sem qualquer precoupação com a cientificidade de sua origem (Bassanezzi, 1994).

Existem dez passos básicos para começar a documentação em etnomatemática. Esta ferramenta funciona para a criação de um banco de dados ou arquivo de atividades que podem ser utilizadas numa perspectiva etnomatemática. Isto também nos permite verificar se uma certa atividade é etnomatemática em natura.

Os passos para se fazer modelagem matemática numa perspectiva etnomatemática são:

1) Escolha do Tema: há necessidade de se realizar o levantamento de possíveis temas de estudo a serem desenvolvidos pelos alunos. Estes temas podem ser: setores de produção, situações econômicas, políticas, sociedade, agricultura, educação, artes, saúde, etc ou podem ter origem etnomatemática. Os temas devem ser abrangentes para que eles possam propiciar questionamentos em várias direções. Uma vez selecionado o tema, os alunos são divididos em grupos que possuem o mesmo interesse de pesquisa. A escolha do tema deve ser orientado pelo professor, pois é importante que os alunos se envolvam no processo e se sintam motivados pelos temas e problemas que serão levantados. Tendo escolhido o tema, não se tem a noção exata do tipo de matemática que vai surgir. Assim, deve-se fazer pesquisas, contar ou medir, pois sempre aparecerá uma tabela de dados para que se possa dar início ao processo de modelagem.

2) Pesquisa sobre o tema: os participantes do grupo devem fazer visitas a vários locais como museus, indústrias, cooperativas, laboratórios, fazendas, universidades, bibliotecas, jornais e revistas, órgãos públicos, de acordo com as necessidades do tema escolhido, para buscar o entendimento do tema que irão estudar. A busca de novas informações devem ser realizadas utilizando-se referências bibliográficas colhidas em livros, revistas, internet, entrevistas ou através de experiências vivenciadas por culturas específicas. A pesquisa tem como objetivo a coleta de dados quantitativos e qualitativos que possam auxiliar na formulação das hipóteses. Estes conhecimentos devem ser analisados e interpretados como preparação dos modelos matemáticos que podem ou não ser baseados nas maneiras de se fazer matemática de determinados grupos culturais.

3) Elaboração de Questionamentos: os questionamentos propostos inicialmente pelos alunos são retirados das situações pesquisadas. São questões diretas cujas formulações são equivalentes aos conteúdos matemáticos que eles conhecem. De uma maneira geral, as primeiras questões colocadas são bastante simples, podendo ser solucionadas com a utilização de uma matemática considerada elementar. Inicialmente, essas questões não enfatizam a necessidade de se conhecer como as questões foram formuladas, o que foi considerado, rejeitado, e qual o relacionamento da questão com o tema. Existirá nesta fase, uma espécie de inibição para questionamentos maiores. Assim, a partir destes primeiros questionamentos, começa a ser feita uma ampliação das idéias que envolverão os alunos na procura de generalizações e analogias com situações correlatas.

4) Elaboracão dos Modelos Matemáticos: por sua natureza conceitual e abstrata, este estágio é muito importante, pois os alunos necessitam de grande ajuda do professor. Procede-se a interpretação dos dados colhidos na pesquisa de campo, sistematiza a coleta e analisa os dados. Nesta etapa elaboram-se questionários que serão utilizados como métodos específicos de amostragem. Posteriormente, efetua-se uma análise das relações entre as variáveis que são consideradas essenciais para o entendimento do fenômeno estudado, formulando as hipóteses, estabelendo desta forma os modelos matemáticos que usualmente são elaborados com a formulação de certos conteúdos matemáticos. Neste estágio, os pré-requisitos matemáticos devem ser trabalhados durante todo o processo. Se o modelo que está sendo analisado é para o aprendizado de um novo conteúdo matemático, é necessário que os alunos saibam o que se pretende com a análise do modelo, descrevendo todas as características que são importantes. Deve-se indicar também o porque certas características foram consideradas e outras foram rejeitadas. Esse procedimento é um aspecto conceitual importante do processo de modelagem, pois tem como objetivo desenvolver a criação de uma imagem mental da situação que está sendo modelada. Este aspecto permite aos alunos experienciá-la mentalmente, internalizando os conceitos necessários à aprendizagem.

5) Formulação dos Problemas Matemáticos: a formulação dos problemas matemáticos devem surgir em consequência de uma série de exemplos analisados pelo professor. O professor deve auxiliar os alunos no entendimento das questões relacionadas ao tema de pesquisa para serem resolvidos. O papel do professor é de mediador do processo, pois esclarece as dúvidas e sugere abordagens diferenciadas ao tema de estudo, num processo dialógico. Todos os questionamentos devem partir do grupo. O professor deve dinamizar o processo. Se as questões não surgirem, ele deve buscar um caminho que induza os alunos a buscarem os seus próprios problemas. A transferência da relação verbal (linguagem materna) em simbologia matemática é uma tarefa que exige um grande esforço por parte dos alunos. O professor deve dar uma atenção cuidadosa para a simbologia que os alunos conhecem, principalmente com relação aos símbolos padronizados, aos parâmetros ou para os dados fornecidos, direcionando os alunos para a formulação dos problemas matemáticos. A formulação de um problema em termos matemáticos é sempre o estágio mais difícil da modelagem. Esta fase deve ser enfrentada com o auxílio do professor e também com a criatividade dos alunos.

6) Resolução dos Problemas Matemáticos: esta fase é importante pois conduz para a tomada de decisão, e merece atenção especial, dada a sua importância no processo. Algumas vezes, o problema não precisa ser solucionado com exatidão. Assim, as suposições ou aproximações são frequentes e necessárias na resolução dos problemas. Devemos ser cuidadosos em não antecipar as dificuldades matemáticas que alunos possam ter, deixando que elas fluam naturalmente. É importante que não enfatizemos a resolução dos modelos matemáticos em torno de uma técnica particular ou de uma teoria específica. Nesta fase, os conceitos matemáticos que foram identificados na solução dos modelos matemáticos devem ser sistematizados.

7) Interpretação da Solução: as discussões devem ser incentivadas e constantes para que os componentes do grupo possam atingir o mesmo grau de compreensão na interpretação da solução dos modelos matemáticos. Os grupos devem trabalhar em seus projetos independentemente. O professor funciona como monitor dos grupos e quando constata problemas comuns e de interesse de todos os grupos, deve propor uma aula coletiva abordando o conteúdo necessário. A interpretação da solução matemática envolve a volta aos conceitos matemáticos que estão relacionados ao problema. A interpretação pode ser realizada de maneira analítica, gráfica ou algébrica.

8) Comparação do Modelo com a Realidade: nesta fase, faz-se a comparação do modelo matemático com o sistema analisado. A validação dos modelos deve ser o mais coerente possível com a realidade pesquisada. Se porventura o modelo não for bom, o sistema deve ser retomado com a elaboração de modelos mais significativos ou, se necessário, novas pesquisas devem ser efetuadas, tornando assim o processo dinâmico. Se o modelo for satisfatório, devemos procurar utilizá-lo para fazer previsões, análises ou qualquer outra forma de ação sobre a realidade. Um modelo é considerado bom se sua capacidade de previsão valida a solução do problema quando confrontado com a realidade.

9) Relatório e Defesa do Tema: no final de cada etapa, os grupos devem expôr os resultados da pesquisa para a classe, que pode colaborar com sugestões para a continuação ou modificação dos modelos. No final do processo, o trabalho deve ser exposto numa espécie de defesa de tese e cada grupo deve apresentar um relatório final onde devem constar os modelos criados para cada questionamento, as hipóteses e as devidas conclusões.

10) Avaliação: na apresentação e defesa do tema, os participantes dos demais grupos devem agir como uma espécie de banca examinadora. Este momento é importante, pois acontece a troca de experiências e críticas com o propósito da melhoria do projeto. Cada grupo é avaliado pelo seu desempenho e cada aluno é avaliado pelos elementos dos grupos, além da auto-avaliação. O professor também avalia as apresentações e os relatórios apresentados pelos grupos.

A Metodologia

Como metodologia de ensino, a modelagem matemática tem outros importantes objetivos. O principal deles é o desenvolvimento do interesse pela pesquisa dos dados que elaborará a documentação dos apectos etnomatemáticos de determinada comunidade ou grupo cultural. Esta pesquisa pode ser realizada através de uma atividade que seja atraente e que se relacione aos costumes dos alunos (modeladores). O modelador aprende a "fazer" matemática na medida em que faz e refaz os seus modelos, melhorando-os. O jogador de futebol atua como "modelador" pois aprende a jogar na medida em que treina e retreina as jogadas. Este processo é extremamente ativo e é uma poderosa forma de pesquisa. Isto significa que o desenvolvimento futuro de habilidades relacionadas com as pesquisas, classificações, criações e relatos de novas formas de levantamento de dados e informações devem utilizar este paradigma científico, pois a análise e a reflexão dos resultados dos modelos matemáticos traduzem situações que são interpretadas no mundo real. A aceitação do programa etnomatemática nas escolas somente ocorrerá se conseguimos fazer a conexão deste programa com alguns objetivos encontrados nos guias curriculares escolares, como por exemplo:

· A inclusão de novas formas de aprendizagem do conteúdo no planejamento.

· O encorajamento do aluno pesquisador na procura de estratégias alternativas.

· O estímulo para a colaboração com o trabalho em grupo.

· Preparar e desenvolver no aluno uma capacidade de aprendizado que seja útil num processo de educação permanente.

· Desenvolver nos alunos capacidades que os habilitem a refletir criticamente.

· Desenvolver nos educandos habilidades como: incentivo a leitura, a capacidade crítica, e também habilidades específicas de comportamento durante situações de insegurança, que são constantes em nossa vida diária.

Roteiro de Trabalho para a Aplicação da Modelagem Matemática em Sala de Aula
É extramente importante que os alunos compreendam a necessidade de seguir um roteiro de trabalho para a realização da pesquisa em modelagem matemática. Cada etapa é importante para a implementação e conclusão do projeto. Dessa forma, o trabalho de acompanhamento e orientaçao dos alunos pelo professor é de fundamental importância. Assim sendo, as principais etapas a serem seguidas são as seguintes:

· Escolha do tema.

· Justificativa da escolha do tema.

· Objetivos principais e específicos inerentes ao tema.

· Breve histórico sobre aspectos curiosos, importantes e interessantes, relacionados ao tema.

· Questão central ou questão orientadora que aborde de maneira geral o tema.

· Aspectos matemáticos relevantes para responder a questão central.

· Formulação do problema, com o levantamento de hipóteses e variáveis.

· Possíveis modelos matemáticos relacionados ao tema.

· Solução dos modelos matemáticos propostos.

· Validação ou teste do modelo matemático.

· Busca das informações ( internet, museus, bibliotecas).

· Arquivo das informações (filmagem, gravação, digitação).

· Metodologia e estratégia para desenvolver a pesquisa (entrevistas diretas, visitas às indústrias e estabelecimentos públicos).

· Cronograma de trabalho, com a indicação do tempo previsto para a realização de cada etapa.

· Conclusão ou Parecer sobre o processo (etapas inicial, intermediária e final).

· Bibliografia e Referências bibliográficas.

Assim, a modelagem matemática fundamenta-se na ampliação da autonomia do aluno e na aproximação da sua realidade com a matemática, propiciando a leitura e a ampliação da visão de mundo e o desenvolvimento do pensamento autônimo , contribuindo para o exercício pleno da cidadania. Podemos afirmar que a etnomatemática como programa de ação pedagógica e a modelagem matemática como metodologia de ensino está construindo o seu espaço de ação, impondo-se de modo sério, sistemático e abrangente. Este program procura refletir sobre as experiências e acontecimentos culturais e sociais, procurando compreendê-los e interpretá-los, tecendo conexões com a realidade que dão legitimidade à ação pedagógica. Com este procedimento, este programa atribui siginificados que esclarecem o contexto sócio-cultural, situando-o na história e permitindo uma ação que refletirá uma intelectualidade autônoma e transformadora. A meta desse programa é levar à comunidade de educadores matemáticos, o conhecimento que está sendo construído nessa área, para que em conjunto todos possamos participar da construção do saber matemático dos nossos alunos.

Exemplos práticos de aplicação da modelagem matemática
Modelagem Matemática e o Planeta Terra

Introdução

A Terra é o terceiro planeta em distância a partir do Sol e o quinto em diâmetro do sistema solar. Possui um satélite natural, a Lua. Formada há cerca de 4,6 bilhões de anos, é o único planeta que dispõe de grande quantidade de oxigênio na atmosfera. Em rela ção à distância ao Sol, ocupa posição privilegiada quanto à temperatura, o que facilita a evolução da vida. Por causa da grande presen a da água, o planeta tem o aspecto de um globo azulado. A Terra é formada basicamente por quatro camadas: crosta, manto, núcleo e núcleo interno. Possui o movimento de rota ção em torno de seu pr›prio eixo, no sentido leste-oeste com dura ção de cerca 23h56min4s. O movimento de translação é feito ao redor do Sol e tem a dura ção de 365dias5h48min45,97s, e origina o ano.

A Terra é azul

"A Terra é azul" foi a frase emocionada dita pelo astronauta Yuri Gagarin em 1961, quando vislumbrou do interior de sua nave, a esfera Terra, solta no espaço, na primeira viagem espacial tripulada e comandada pela União Soviética. Se ao invés do comentário sobre a cor do planeta, ele tivesse dito " A Terra é arredondada” não estaria afirmando nenhuma novidade para o século XX. Porém, causaria muito espanto se tivesse dito esta frase na antiguidade, aos babilônios, egípcios ou hindus, pois para esses povos e para muitos outros, a idéia que faziam da Terra era bastante diferente e variável.

Para os babilônios, a Terra era uma montanha oca, sustentada e rodeada pelo mar. Em seu interior situava-se o reino dos mortos. O Sol, a Lua e as estrelas se moviam num sólido firmamento que estava inserido num arco sobre a Terra.

Os egípcios imaginaram a Terra como o deus Keb reclinado, coberto de vegetação e o céu como uma deusa graciosamente encurvada e sustentada no alto pelo deus da atmosfera. O deus Sol era dois barcos que navegavam diariamente pelo firmamento até penetrar na noite da morte.

Os hindus tinham várias visões diferentes sobre a Terra. Uma de suas tribos acreditava que a Terra era sustentada por elefantes, cujos movimentos causavam terremotos. Os elefantes ficavam sobre uma tartaruga, encarnação do Deus Vixnu, o qual descansava sobre uma cobra, símbolo da água.

A hipótese de que a Terra e os demais corpos celestes são esféricos e se movimentam em órbitas circulares foi levantada pelo grego Pitágoras e pelos pitagóricos no século VI a.C.. No início do século XVII, Galileu Galilei (1564-1642) pôs em dúvida a hipótese da esferecidade da Terra. No final deste mesmo século, Newton (1641-1726) afirmava que a Terra era achatada nos polos e não perfeitamente esférica, como os grandes cientista imaginavam.

A esfera

A esfera é um sólido presente na história do homem desde os tempos mais remotos. Por volta do ano 2600 antes de Cristo, os chineses jogavam o "kemari", praticado com uma bola de fibra de bambu. Na literatura grega e romana, há referências sobre jogos com bolas feitas com bexigas de boi infladas que divertiam os jovens da época. Na Grécia antiga os jogos eram chamados "epyskiros" e no Império Romano "harpastum". Na Idade Média, os habitantes da Floren a na Itália, praticavam o "gioco del calcio" chutando uma bola pelas ruas. O mesmo fazem os ingleses no "Shrovetide" festa que relembra a explusão dos dinamarqueses da Inglaterra, ocorrida no século XII.

Arquimedes, um geômetra grego que viveu em Siracusa no período de 287-212 antes de Cristo, pediu que fosse esculpida em seu túmulo uma representação de uma esfera inscrita num cilindro reto. Dentre todos os modelos matemáticos presentes em sua vasta obra , ele dizia preferir o tratato "Sobre a esfera e o cilindro."

O orador e filósofo romano Marcus Tullius Cícero que viveu no período de 106-43 antes de cristo, encontrou o túmulo abandonado de Arquimedes na Sicilia e proferiu estas palavras:

Ali, entre os arbustos, na campina de Siracusa, encontrava-se uma pequena coluna, encimada por uma esfera, inscrita em um cilindro. A epígrafe estava quase apagada mas, eu sabia que aquela escultura devia estar sobre a tumba de Arquimedes.

O cilindro e o cone podem ser obtidos através de moldes feitos em uma folha de papel, ou seja, eles podem ser planificados. A esfera, porém, não pode ser assim obtida, pois não pode ser planificada. Essa é uma das evidências da dificuldade de se reproduzir num mapa, as regiões do globo terrestre.

A esfera pode ser gerada pela rotação completa de um semi-círculo em torno do diâmetro. Nesse movimento, cada ponto do semi-círculo descreve uma circunferência que tem por centro um ponto do diâmetro AB e cujo raio é tanto maior quanto maior é a sua distância do eixo. Da forma como é gerada, todos os pontos da superfície esférica são igualmente distantes do centro O da esfera.

Vamos abandonar esta imensa esfera terrestre e tomemos por base um minúsculo planeta esférico de nome "Zilia", habitado por um único habitante chamado "Zil", semelhante ao idealizado por Exupèry, em sua obra prima "O Pequeno Príncipe". Neste planeta, existem também uma rosa que é a paixão de "Zil", e um vulcão que precisa ser revolvido de tempos em tempos.

Modelo Matemático

Hipótese: De acordo com a geometria tradicional (euclidiana), numa superfície plana, a reta é a distância mais curta entre dois pontos. Considerando, para efeitos didáticos e pedagógicos que a forma do planeta Terra é perfeitamente esférica, será a reta a distância mais curta tomada entre dois pontos quaisquer sobre a superfície terrestre?

Dessa maneira, querendo passar da teoria à prática,"Zil" resolveu marcar de algum modo, o caminho mais curto, que o levasse diariamente, de sua casa até a rosa. Utilizando-se de pregos trazidos do planeta Terra, que pareciam enormes em "Zilia", "Zil" esticou um pedaço de barbante, de sua casa ao canteiro da rosa, esperando obter uma reta, idêntica às retas que vira desenhadas em seus livros de geometria. Chegando até a rosa, "Zil" lembrou-se de ter lido também que a reta podia ser prolongada infinitamente e isto deixou-o intrigado, pois ficou imaginando o que haveria no "infinito" de seu planeta. Dessa forma, ele amarrou o barbante no prego que ficava no canteiro da rosa e esticando o barbante que sobrou, continuou andando em linha reta o caminho que o levasse de volta à sua casa. Após algum tempo, para a surpresa de "Zil", ele estava de volta à sua própria casa. "Zil" observou que levara menos tempo do canteiro da rosa à sua casa, do que de sua casa ao canteiro da rosa. "Zil" ficou momentaneamente confuso e sem resposta, pois começou a se questionar sobre o que tinha aprendido nos livros de que a reta é o menor caminho a ser percorrido entre dois pontos.

Com a curiosidade aguçada sobre este questionamento, "Zil" não desistiu de seu intento e no dia seguinte começou a elaborar outro caminho. Ele procedeu da seguinte maneira:

a) Foi de sua casa ao canteiro da rosa utilizando o caminho de volta do dia anterior, que tinha sido o mais curto.

b)Chegando ao canteiro da rosa caminhou na direção do vulcão.

c)Chegando ao vulcão caminhou de volta para a casa.

Enquanto fazia estes trajetos "Zil" pensou que tinha feito um trajeto parecido com os triângulos que tinha estudado nos livros.


Havia muitos recantos interessantes e bonitos no pequeno planeta "Zilia" e a cada passeio que "Zil" fazia, ele registrava esses caminhos marcando-os com barbantes.



Um dia, surgiu um cometa em seu planeta e "Zil" de carona na cauda do cometa, começou a passear no espaço, indo para outros mundos. Este dia foi muito especial, pois finalmente poderia ver o seu planeta do alto, enfeitado de retas, triângulos e outras figuras que ele fizera com os barbantes.

"Zil" porém ficou muito surpreso com o que viu, pois no lugar de retas havia cørculos e arcos de circunferência. O triângulo que ele viu era diferente dos que estavam desenhados nos livros, pois não tinham os lados retos.

Assim, ele começou a se questionar sobre o que estava acontecendo com a geometria de seu planeta. Ansioso e querendo compreender o que estava acontecendo, o cometa levou "Zil" mais uma vez ao planeta Terra. Como "Zil" era de outro planeta, ele conseguia ver o que era imaginário e conseguia descobrir coisas incríveis. Dessa forma, diferentemente das outras vezes, "Zil" resolveu prestar atenção nas linhas que os homens chamavam de linhas imaginárias.

"Zil" compreendeu que as linhas imaginárias eram círculos de raios variáveis e de mesmo centro, ou melhor, de mesmos centros, pois os pontos N, situado no Polo Norte e S situado no Polo Sul, poderiam ser centros de tais círculos, uma vez que todos os pontos de cada círculo possuem a mesma distância de N e de S. "Zil" descobriu que os habitantes da Terra chamam de Equador ao maior desses círculos. Observando o planeta Terra, ele também ficou fascinado quando percebeu que se três pessoas resolvessem caminhar indefinidamednte, uma através da linha do Equador, outra sobre o Trópico de Câncer e outra pelo Trópico de Capricórnio, elas jamais se encontrariam. Neste momento, a idéia de retas paralelas que "Zil" possuia se ampliava. Ele aprendeu que na superfície da Terra, há um conjunto infinito de círrculos, paralelos, que têm os "polos" Norte (N) e Sul (S), como centros. "Zil" come ou a raciocionar e com a possibilidade que tinha em visualizar o imaginário, ele escolheu outros pontos como centro e pode ver outros conjuntos de círculos paralelos. Brincando com a sua imaginação, ele começou a enxergar quadrados e triângulos, só que diferentes dos tradicionais que são feitos com régua. Dessa forma, "Zil" percebeu que a geometria do planeta Terra é muito parecida com a geometria do planeta "Zilia" e um pouco diferente da geometria que estudou nos livros importados da Terra.

Conclusão:

A realização de um experimento interessante utilizando esferas de isopor e barbantes, possibitou a construção de modelos que representaram a situações experimentadas na aventura de "Zil". Dessa maneira, com as observações efetuadas e com as pesquisas realizadas, pudemos formular a conclusão que descrevemos.

Numa superfície plana, a reta é a menor distância que existe entre dois pontos. Porém, se considerarmos que vivemos num espa o curvo, num planeta que não possui a forma plana, a menor distância entre dois pontos que são selecionados na superfície terrestre é um arco de circunferência. Devemos entender que além da geometria tradicional, chamada de euclidiana, existe também a geometria não-euclidiana, que concebe as formas com mais dimensões do que as conhecidas por nossa percepçao, e para conter essas formas, os espa os são imaginados com infinitas dimensões. Segundo Johan Karl Friedrich Gauss (1777-1855), que foi o primeiro matemático a formular idéias sobre a geometria não-euclidiana, o espa o não precisa ser necessariamente imaginado em linhas retas, pois se uma reta é definida apenas pela sua extensão, nada a impede de ser curva. Assim sendo, se uma superfície é definida pelas dimensões comprimento e largura, também poderia ser curva. O mesmo raciocínio valeria para um espaço definido pelas dimensões comprimento, altura e largura. A idéia de espaços curvos é desenvolvida pelo matemático russo Nikolai Lobacheviski (1792-1856) em 1826 e aperfeiçoada em 1854 pelo matemático alemão Georg Friedrich Bernhard Riemann (1826-1866), discípulo de Gauss, que também concebe espaços com quatro ou mais dimensões.

Considerações Finais

Os projetos propostos têm como fundamento a compreensão e o entendimento da realidade e do grupo cultural nos quais os alunos estão inseridos. Dessa maneira, os alunos podem pensar, refletir, analisar e agir sobre essa mesma realidade. Ao emprestarmos da realidade os sistemas nela existentes, passamos a estudá-los simbolicamente e sistematicamente. Neste contexto, emprega-se o programa etnomatemática, utilizando como instrumentos a modelagem matemática e os seus modelos. Dessa forma, pode-se atingir o mundo real com a utilização do mundo imaginário, empregando-se conceitos do mundo matemático para a solução de problemas abstratos. Compreende-se que a utilização do programa etnomatemática fornece as ferramentas necessárias para que os grupos culturais possam captar as mensagens que são transmitidas pelo mundo real. Assim, modelando os sistemas que são extraídos da realidade, desperta-se nos alunos a vontade de compreender as relações existentes entre a natureza, a cultura e a intervenção humana sobre esses sistemas. Dessa maneira, a partir desta reflexão, os alunos conseguem perceber a realidade em sua totalidade.

O programa etnomatemática também possui um caráter interdisciplinar. Assim, este programa exige a participação de professores de diferentes áreas do conhecimento para o encaminhamento dos projetos e orientação dos alunos. É de fundamental importância para o sucesso do programa e o desenvolvimento intelectual dos alunos que esta participação ocorra de modo efetivo. Dessa forma, esse aspecto procura garantir o interesse dos alunos pela iniciação científica na área matemática, pois a partir do envolvimento na pesquisa de temas variados, incentiva-se a evolução da investigação e da aprendizagem em matemática.

Espera-se que durante este processo, educandos e professores adquiram e desenvolvam de maneira semelhante o senso crítico, isto é, uma forma de cidadania baseada no entendimento e na igualdade. Este processo de pesquisa é formulado para dar aos pesquisadores experiências em tornarem-se cidadãos e profissionais críticos. Este aspecto do aprendizado é muito imporante pois contribui para acelerar o processo de transformação social. Este processo é também de vital importância na resolução de problemas e desafios que estão presentes em nossas comunidades.

A falta de uma consciência crítica na educação escolar tem criado uma distinta dissociação para os alunos entre os que eles estão aprendendo nas salas de aula e o que eles observam no mundo real. Os alunos, muitas vezes passivos, solucionam problemas que não fazem parte da vida pessoal, da realidade ou da sociedade em que estão inseridos. Rapidamente e facilmente eles perdem a habilidade em prestar atenção e participar dos desafios que estão acontecendo na comunidade.Em outras palavras, as atividades matemáticas estão em perigo se não tiverem uma mínima utilidade real para os alunos. O que este modelo pode facilmente realizar é engajar os alunos a verem o valor e a utilidade do que eles aprenderam em matemática pelo desenvolvimento de uma posição crítica que suporte diferentes propostas na resolução Este processo afirma que historicamente os métodos de se fazer matemática, de resolver problemas, foi oferecido por muito tempo pela cultura dominante. Também afirma que aprender a valorizar diversas e alternativas maneiras de resolver problemas é uma das mais altas formas do desenvolvimento intelectual para todos os indivíduos.




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"MODELAGEM MATEMÁTICA NA TRIGONOMETRIA"



Pesquisa Operacional
Print version ISSN 0101-7438
Pesqui. Oper. vol.29 no.1 Rio de Janeiro Jan./Apr. 2009
doi: 10.1590/S0101-74382009000100007
Modelagem matemática do efeito chicote em ambientes com demanda e lead time estocásticos





José Carlos FioriolliI; Flávio Sanson FogliattoII, *

IEscola de Administração, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre – RS, fioriolli@producao.ufrgs.br
IIDep. de Engenharia de Produção e Transportes, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre – RS, ffogliatto@producao.ufrgs.br

RESUMO

O aumento da variabilidade da demanda ao longo de uma cadeia de abastecimento é conhecido como Efeito Chicote (EC). A modelagem deste fenômeno é fundamental para a quantificação de sua intensidade, ajudando a reduzir seus impactos negativos sobre o nível de serviço e sobre os estoques em cadeias de abastecimento. Este artigo apresenta uma proposta de modelagem do EC que tem por objetivo aumentar a precisão na quantificação deste fenômeno em ambientes com demanda e lead time estocásticos. O novo modelo considera um elemento que não está presente nos principais modelos disponíveis na literatura: a variabilidade no lead time de entrega de pedidos. Além disso, define de modo mais preciso o papel do coeficiente de variação da demanda na quantificação do EC. A utilização do modelo proposto aumenta a eficiência da gestão de cadeias de abastecimento ao contribuir para atenuar a propagação do EC.

Palavras-chave: efeito chicote; modelagem estocástica; cadeia de abastecimento.


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ABSTRACT

The increase in demand variability as information flows from customers to manufacturers in a supply chain is known as the Bullwhip Effect (BE). Modeling this phenomenon is key in measuring its intensity, aiming at reducing its negative impact on both service and inventory levels in supply chains. This paper proposes a new, more precise mathematical model for quantifying the BE in systems with stochastic demand and lead time. The new model takes into account the lead time variability, an element not present in the BE literature. In addition, the model allows a more precise assessment of the role that the demand's coefficient of variation plays when quantifying the BE. The use of the proposed model enables an improved management of the supply chain by attenuating the propagation of the BE.

Keywords: bullwhip effect; stochastic modeling; supply chain.


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1. Introdução

Uma cadeia de abastecimento (CA) é uma estrutura que compreende um conjunto de atividades intra e interempresariais. De acordo com Delfmann (2000), inicia com a aquisição de matéria-prima junto a fornecedores independentes, passa pela fabricação e distribuição, e termina com a entrega dos produtos aos varejistas ou consumidores finais.

O efeito chicote (EC) é um importante fenômeno presente em CAs. Segundo Chen et al. (2003), observa-se um EC quando a variabilidade da demanda aumenta na medida em que se avança nos níveis da cadeia, desde o varejista até o fabricante, produzindo impactos negativos sobre a regularidade e a estabilidade dos pedidos recebidos em todos os seus níveis.

A dinâmica do EC em dois níveis adjacentes k e k- 1 de uma CA pode ser assim descrita. O pedido gerado pelo nível k é definido a partir da previsão de demanda do nível imediatamente anterior (k–1) e depende dos dados históricos relativos àquela demanda e da técnica de previsão utilizada no nível k. Da mesma forma, os pedidos gerados pelo nível k+1 são definidos em função dos dados históricos disponíveis sobre a demanda no nível anterior (k) e da técnica de previsão utilizada no nível k+1. Esta lógica se repete a cada avanço de nível, de modo que os dados disponíveis, em cada nível (com exceção do nível mais baixo da cadeia), baseiam-se em uma expectativa de demanda e não na demanda real.

Vários aspectos gerenciais merecem destaque neste processo de amplificação da variabilidade da demanda. De acordo com Lee et al. (1997), Carlsson & Fullér (2000) e Chen et al. (2003), o EC potencialmente traz consequências locais e sistêmicas para fabricantes, distribuidores e varejistas. Entre as consequências locais, destacam-se (i) baixos níveis de serviço, gerados pela dificuldade de amortecer, em tempo hábil, as variações extremas da demanda; (ii) vendas perdidas em função das rupturas de estoques geradas pelas variações extremas da demanda; (iii) aumentos dos estoques de segurança, com vistas à recuperação dos níveis de serviço que garantam a competitividade da estrutura; (iv) aumento no número de reprogramações de produção para cobrir emergências; e (v) gestão ineficiente de recursos locais, como pessoal, equipamentos e capital. Entre as consequências sistêmicas, destacam-se: (i) elevação dos custos relacionados a estoques na CA em razão do aumento dos estoques locais, em cada um dos pontos do sistema; (ii) queda do retorno sobre o capital investido nas operações da CA; (iii) queda da produtividade dos funcionários que atuam nos processos produtivos ao longo da CA, conforme demonstrado por Anderson e Fine (2003); (iv) processo decisório reativo, principalmente em função dos picos de demanda, causando ruptura de planejamento; e (v) gestão ineficiente dos recursos da CA como um todo, em decorrência das ineficiências locais e da dificuldade de integração das operações da CA.

O principal desafio no gerenciamento do EC consiste em reduzir ineficiências e atenuar/eliminar a sua propagação ao longo da CA, de modo que seja possível otimizar o uso dos recursos empregados em seus diferentes níveis. Isto depende do grau de conhecimento que se tem sobre as suas causas e sobre a sua intensidade.

Nesse sentido, a quantificação do EC tem sido um tema frequente de pesquisa nos últimos anos. Autores como Lee et al. (1997), Chen et al. (2000), Fransoo & Wouters (2000) e Warburton (2004) vêm apresentando importantes desenvolvimentos teóricos sobre o tema. Um dos principais modelos de quantificação do EC, apresentado por Chen et al. (2000), é formulado como função do lead time, da variância da demanda e do número de períodos utilizados na previsão da demanda. O modelo trabalha com cenários com lead time constante, o que não reflete a realidade de grande parte das CAs, em vários setores econômicos. Além disso, em sua operacionalização, o modelo de Chen et al. (2000) não quantifica a influência do coeficiente de variação da demanda sobre o EC. De modo similar, os modelos de Lee et al. (1997), Fransoo & Wouters (2000) e Warburton (2004) também operam em ambientes com lead time constante. Tais restrições nesses modelos resultam em uma quantificação parcial do EC, sendo aplicáveis em cenários raramente encontrados na prática, uma vez que os lead times de entrega normalmente apresentam variabilidade.

As principais contribuições do presente artigo visam suprir as deficiências e limitações presentes nos modelos de quantificação do EC disponíveis na literatura. Mais especificamente, propõe-se um modelo matemático para quantificação do EC em ambientes que utilizam a política de pedidos do tipo out-EA (order-up-to Estoque Alvo), sujeitos à demanda e lead time estocásticos e independentes, supondo ambas as variáveis como normalmente distribuídas. Além de considerar a variabilidade nos lead times de entrega de pedidos nos diferentes níveis da CA, explicita-se no novo modelo o grau de influência que o coeficiente de variação da demanda exerce sobre a amplificação da variabilidade da demanda ao longo da CA.

O desenvolvimento de uma modelagem matemática de acordo com a proposta aqui apresentada se justifica já que, a partir da incorporação da variabilidade do lead time e da determinação do grau de influência que o coeficiente de variação da demanda exerce sobre o EC, torna-se mais precisa a identificação das causas deste fenômeno e mais fácil o entendimento da sua dinâmica. Isto é fundamental para a adoção de medidas gerenciais que visem à redução dos impactos negativos do EC sobre os estoques e os níveis de serviço em uma CA. Complementarmente, a modelagem pode ser utilizada para otimizar as quantidades a serem estocadas nos diferentes pontos de uma CA e para qualificar os processos decisórios relacionados à gestão dos estoques globais.

A escolha da política out-EA deve-se ao seu desempenho em ambientes estocásticos. A partir do trabalho de Clark & Scarf (1960), vários autores desenvolveram pesquisas que demonstram a otimalidade desta política em ambientes hierárquicos com demanda normalmente distribuída, entre os quais destacam-se Muharremoglu & Tsitsiklis (2001) e Chen et al. (2003). Para um detalhamento sobre a prova de otimalidade da política out-EA em ambientes com demanda e lead time estocásticos, ver Muckstadt (2005).

Por viabilizar uma quantificação mais precisa do EC em CAs, a implementação prática do modelo aqui proposto pode contribuir para: (i) a incorporação do EC na otimização dos estoques globais de uma CA; (ii) redução dos custos dos estoques; (iii) identificação das quantidades ótimas a serem estocadas nos diferentes pontos da CA; e (iv) qualificação dos processos decisórios relacionados à previsão de demanda.

Este artigo está organizado em cinco seções, incluindo a presente introdução. Na seção 2, apresentam-se os principais modelos de quantificação do EC disponíveis na literatura. Um novo modelo para quantificação do EC, menos restritivo em seus pressupostos, é apresentado na seção 3. Uma análise comparativa do desempenho do novo modelo em relação ao modelo de Chen et al. (2000) é apresentada na seção 4. Uma conclusão encerra o artigo na seção 5.



2. Referencial Teórico

O EC refere-se a uma situação em que o tamanho dos pedidos enviados aos fornecedores tende a apresentar maior variância do que as vendas efetuadas junto aos compradores (Carlsson & Fullér, 2001). De acordo com Lee et al. (1997), ocorre uma distorção da demanda, que se propaga ao longo da CA através do fluxo básico de informação e produz uma amplificação da variabilidade dos pedidos encaminhados aos fornecedores.

Considerando uma estrutura com três níveis [(i) Loja; (ii) Depósito; e (iii) Fornecedor], observa-se que a demanda dos clientes apresenta pequenas variações durante o ano (Figura 1). Em razão da distorção da informação no sistema, os pedidos da Loja para o Depósito (Figura 2) apresentam variações maiores em comparação à demanda dos clientes. No último nível, os pedidos encaminhados ao Fornecedor estão amplificando as variações observadas na Loja e no Depósito (Figura 3).









As abordagens utilizadas para a quantificação do EC podem ser divididas em três grupos: (i) cálculo da relação entre a variância dos pedidos e a variância da demanda, utilizado por Lee et al. (1997) e Chen et al. (2000); (ii) cálculo da relação entre a taxa de pedidos e a taxa da demanda, utilizado por Warburton (2004); e (iii) cálculo do quociente entre o coeficiente de variação da demanda gerada por um nível da cadeia e o coeficiente de variação da demanda recebida por este mesmo nível, utilizado por Fransoo & Wouters (2000).

Contribuições da metodologia da modelagem matemática para os cursos de formações do professores

Contribuições da metodologia da
modelagem matemática para os cursos
de formação de professores
MARINEZ CARGNIN-STIELER
VANILDE BISOGNIN
Centro Universitário Franciscano de Santa Maria, Brasil
Introdução


A prática pedagógica desenvolvida com o ensino de matemática em geral repete a formação adquirida durante a vida acadêmica com algumas exceções. Nesse contexto, volta-se a um ensino embasado em conceitos prontos e em fórmulas que o aluno simplesmente memoriza. Percebe-se que essa prática está disseminada em todos os níveis de ensino e, em cursos de formação de professores, implica
em resultados mais agravantes, pois os egressos tendem a repetir as experiências vivenciadas durante a graduação. A busca de alternativas pedagógicas, em especial em cursos de formação de professores, que proponham a participação e a responsabilidade dos alunos no processo de ensino-aprendizagem faz-se urgente e necessária. Nesse sentido, encontram-se várias alternativas vivenciadas por grupos de pesquisas e trabalhos que buscam dirimir a situação descrita. Entre elas está a Modelagem Matemática que vem se afirmando como uma prática pedagógica e tem apresentado resultados positivos ao ser utilizada em sala de aula em diferentes níveis de ensino.
Neste trabalho descrevem-se os resultados obtidos com a investigação realizada em uma turma de sétimo semestre do Curso de Licenciatura em Matemática, tendo-se a modelagem matemática como metodologia de ensino. A disciplina escolhida para desenvolver a pesquisa foi “Projeto de Pesquisa e Extensão em Educação Matemática” por oportunizar aos acadêmicos uma experiência na qual eles puderam fazer a relação teoria-prática-teoria. A disciplina foi oferecida durante um semestre letivo com
encontro de duas horas semanais, perfazendo 30 horas. Justifica-se a escolha da modelagem matemática como método didático por possibilitar a exploração de questões relacionadas ao contexto e ao interesse dos alunos e, dessa forma, dar significado
aos conteúdos estudados; bem como justifica-se por permitir um trabalho colaborativo e integrado entre professor e alunos, tornando-os co-responsáveis no processo de aprendizagem. Modelagem matemática A modelagem matemática, do ponto de vista dos matemáticos aplicados, constitui-se em um método de pesquisa que procura entender, propor e resolver problemas do mundo real. A complexidade das situações reais que se apresentam requer, muitas vezes, o envolvimento de equipes interdisciplinares
de diferentes áreas como a Física, Química, Economia, ecologia, Informática, entre outras. Observa-se que situações-problema envolvendo inúmeras variáveis são cada vez mais estudadas por equipes multidis-ciplinares e têm trazido avanços à pesquisa matemática e demais áreas. O trabalho coletivo de equipes de pesquisadores tem permitido a obtenção de resultados inovadores e impulsionado o avanço das ciências e
da tecnologia. Nesse contexto, o foco central é a pesquisa matemática.
As práticas utilizadas na pesquisa em Matemática Aplicada influenciaram fortemente a modelagem matemática como metodologia de ensino e aprendizagem na sala de aula. Essa metodologia caracteriza-se como um processo de construção de um modelo matemático a partir de uma problemática adquirida do contexto e/ou do interesse dos alunos e professores. Nesse processo estão envolvidas determinadas ações que são trabalhadas, conjuntamente, por professores e alunos, quais sejam: definição da problemática ou
tema; busca de informações e dados relacionados ao tema; seleção de variáveis; formulação de hipóteses; simplificações; resolução de problemas; análise das soluções encontradas e validação do modelo construído, vinculado ao tema inicialmente proposto. Nesse ambiente de busca de respostas para os problemas propostos cria-se um ambiente favorável ao estudo da Matemática.
Segundo Bassanezi, apud Barbosa (2001a, p. 2), um modelo matemático trata “quase sempre [de] um sistema de equações ou inequações algébricas, diferenciais, integrais, etc., obtido através de relações estabelecidas entre as variáveis consideradas ao fenômeno sob análise”. Embora esse conceito envolva apenas questões ligadas à Matemática, pela modelagem, como metodologia de ensino, permite ir além
das questões puramente matemáticas. Problemas que afetam a sociedade podem ser tratados em sala de aula, permite-se trabalhar conteúdos matemáticos e, ao mesmo tempo, explorarem-se conhecimentos correlatos ao tema, o que contribui para a formação de alunos críticos e capazes de refletir sobre os problemas que afetam suas vidas e a sociedade. Diferentes autores nacionais como Bassanezi (2002); Barbosa (2001); Almeida e Dias (2004); Almeida e Brito (2005); Ferruzzi (2004), Almeida e Gonçalves (2006); Caldeira (2004); Araújo (2004); Biembengut e Hein (2003); D’Ambrósio (1996); Borba, Meneghetti e Hermini (1997), entre outros e autores internacionais, como Blum e Niss (1991), têm trazido contribuições significativas para o uso da Modelagem Matemática no contexto escolar. Conforme Barbosa, Caldeira e Araújo (2007), as pesquisas desenvolvidas relacionam-se com diferentes problemas como: aspectos teóricos da modelagem; modelagem e formação de professores; modelagem e prática de sala de aula; modelagem matemática e as tecnologias da informação e da
comunicação.
Podem ser citados argumentos favoráveis ao uso da modelagem matemática em sala de aula, como: a motivação, facilitação da aprendizagem, cooperação e integração entre alunos e professores no trabalho escolar, desenvolvimento de habilidades de investigação, oportunidade de aplicar a matemática em diferentes contextos e a compreensão do papel sociocultural da matemática. Para Burak (2004), a modelagem matemática, quando usada em sala de aula, vem ao encontro das expectativas do educando por dar sentido ao que ele estuda e por satisfazer suas necessidades e interesses. O aluno trabalha com entusiasmo e perseverança tendo atitudes positivas em relação à matemática, ou seja, desperta nele o gosto pela disciplina. Para Bisognin, Bisognin e Rays (2004, p. 82), “o ensino de Matemática, por meio da Modelagem Matemática, proporciona ao aluno o contato com problemas reais e desenvolve a capacidade de resolvê-los”. A concepção de modelagem matemática que se adotou em todo o trabalho foi definida por Bassanezi (2002, p. 16): “a arte de transformar problemas da realidade em problemas matemáticos e resolvê-los, interpretando suas soluções na linguagem do mundo real”. Assim, parte-se do pressuposto que a matemática trabalhada por meio da metodologia da modelagem traz sentido para a aprendizagem. Ao abordar temas do contexto e do interesse dos alunos os conteúdos trabalhados, na sala de aula, passam a ter sentido. Nesta direção concorda-se com a afirmação de Gadotti (2003, p. 48) quando ele argumenta
porque as pessoas aprendem: “Todo ser vivo aprende na interação com o seu contexto: aprendizagem é relação com o contexto. Quem dá significado ao que aprendemos é o contexto. Por isso para o educador ensinar com qualidade, ele precisa dominar, além do texto, o com-texto, além do conteúdo, o significado do conteúdo que é dado pelo contexto social, político, econômico... enfim, histórico do que ensina.”
Sobre a Modelagem Matemática, Caldeira (2004) enfatiza a necessidade dos conhecimentos matemáticos para o indivíduo atuar como sujeito de transformação social em que a aprendizagem deve partir do contexto sociocultural do aluno, proporcionando-lhe o desenvolvimento do pensamento lógico, da criatividade, de aprender conceitos e de construir estruturas matemáticas, a fim de compreender a realidade social, histórica e cultural.
O fato de o contexto e o conteúdo estarem intimamente relacionados diminui a possibilidade de uma aprendizagem mecânica, na qual a compreensão se dá de forma fragmentada e dissociada de aplicações em novas situações. A modelagem matemática, por sua natureza, envolve uma aprendizagem significativa e contextualizada ao contemplar pesquisa e investigação, a partir de temas propostos pelos alunos e professores, em um processo de diálogo permanente. A esse respeito, Demo (1990) afirma que a visão da pesquisa no contexto dos interesses sociais é fundamental, e pesquisar é aprender em sentido criativo, é aprender de fato e faz parte do processo emancipatório, no qual se constrói o sujeito crítico, capaz de valorizar, ser valorizado e capaz de questionar de forma criativa a realidade. A aprendizagem, por meio de pesquisas, facilita o processo de construção de um sujeito com atitudes próprias, capaz de argumentar e discutir questões sociais.
“Nossos alunos precisarão aprender a iniciação à pesquisa e aos trabalhos científicos, a fazer investigação de caráter básico, a socializar esses conhecimentos, a desenvolver competências e atitudes que lhes permitam
analisar e discutir criticamente a ciência e suas soluções para os problemas da humanidade como hoje se apresentam, e a tomar decisões com responsabilidade de profissionais competentes e cidadãos.” (Masetto, 2001, p. 84).
Para Freire (1996), é indispensável que o professor saiba, que o fundamental no ser humano é despertar a curiosidade. Ela faz o sujeito perguntar, conhecer, atuar e reconhecer. Entende-se que, ao se trabalhar com a modelagem matemática, é possível também aguçar a curiosidade do aluno que investigará a problemática de seu interesse, pois essa lhe despertou a curiosidade de saber mais, de pesquisar.
Conclui-se que trabalhar com a metodologia de modelagem matemática em sala de aula é um desafio, uma vez que tanto o professor, quanto os alunos são desafiados a todo instante e ambos são responsáveis pelo trabalho em sala de aula, que é desenvolvido de forma colaborativa e participativa.
Procedimentos metodológicos O problema de pesquisa que orientou a investigação foi: a modelagem matemática, como metodologia de ensino, contribui para uma aprendizagem significativa e contextualizada de conceitos matemáticos e estatísticos em um curso de licenciatura? O objetivo geral foi analisar as possibilidades que a modelagem matemática oferece à aprendizagem contextualizada e significativa de conceitos matemáticos e estatísticos, em uma turma de sétimo semestre de um Curso de Licenciatura em Matemática. O método de investigação escolhido foi a observação participante, que se trata de uma forma consciente e crítica de o pesquisador obter as informações desejadas, interferindo, quando necessário. Para Alves-Mazzotti (1999), a observação participante é utilizada nas pesquisas qualitativas e o pesquisador é o principal e o mais confiável instrumento de observação, seleção, coordenação e interpretação. Na pesquisa qualitativa, segundo Barbosa (2001c, p. 82), “o pesquisador é considerado instrumento de pesquisa, que pode recorrer às suas experiências, ao seu conhecimento táctico e aos seus pressupostos existenciais para
coletar os dados, compreendê-los e interpretá-los”.
Quanto à apresentação dos dados, a pesquisa foi descritiva, pois, essa, segundo Gil (2002), é a que descreve as características de um determinado grupo ou define as associações entre as variáveis. Quanto ao método de análise dos dados, foi qualitativa com triangulação de fontes. Considera-se que a pesquisa tem uma abordagem qualitativa por trabalhar com o pensamento do aluno, analisando as respostas e atitudes em sua complexidade (D’ambrósio, 2002). Nessa abordagem, o raciocínio é dialético e indutivo, preocupa-se com a qualidade das informações, possibilita narrativas e interpretações individuais ou partilhadas, dependendo do contexto. Para Oliveira (2002, p. 117): “As pesquisas que se utilizam da abordagem qualitativa possuem a facilidade de poder descrever a complexidade de uma determinada hipótese ou problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar processos dinâmicos experimentados por grupos sociais, apresentar contribuições no processo de mudança, criação ou formação de opiniões de determinado grupo e permitir, em maior grau de profundidade, a interpretação das particularidades dos comportamentos ou atitudes dos individuos”.
No desenvolvimento da investigação foram utilizados mais de um instrumento para obtenção dos dados como: observação participante, Diários de Campo, análise de documentos e entrevistas. O acompanhamento do desenvolvimento das atividades de modelagem matemática foi realizado através de registros sistemáticos no Diário de Campo da pesquisadora, no qual foi registrado o que ocorreu durante o andamento das atividades. Para Feil (1995, p. 13), o Diário de Campo “é o instrumento pelo qual o
pesquisador registra, descreve, ordena dados, toma novas decisões e produz conhecimento [...]”. Durante a pesquisa, cada grupo de alunos participantes recebeu seu Diário de Campo, para o registro do andamento de suas aprendizagens, relatos das dificuldades, das dúvidas, dos acertos, da validade dos problemas por eles mesmos propostos e que permitiu fazer uma auto-avaliação do grupo e triangulação dos dados.
Analisaram-se também os documentos produzidos pelos grupos de alunos, ou seja, seus trabalhos escolares. Segundo Alves-Mazzotti (1999, p. 169), documento é “qualquer registro escrito que possa ser usado como fonte de informação”.
Outro procedimento metodológico utilizado foi a entrevista semi-estruturada, que se trata de uma forma de obter dados, utilizando perguntas pré-determinadas, tendo a pesquisadora liberdade de fazer pequenas alterações, dependendo do rumo da entrevista. Para Feil (1995), a entrevista semi-estruturada é composta de perguntas planejadas com o objetivo de servir de parâmetro para o pesquisador e são
desenvolvidas de forma natural, seguindo o rumo que a própria entrevista propõe. Para Alves-Mazzotti (1999) na entrevista semi-estruturada as perguntas são específicas e o sujeito responde com suas palavras. Aplicou-se a entrevista semi-estruturada como um instrumento de coleta de dados de caráter qualitativo: as
questões foram levantadas como parâmetros para a pesquisadora e foram desenvolvidas de forma natural. Foram realizadas entrevistas individuais com todos os sujeitos da pesquisa e uma entrevista coletiva. As entrevistas foram gravadas para que a pesquisadora tivesse mais liberdade e dedicasse maior atenção aos
sujeitos da pesquisa, às suas expressões e explanações.
A entrevista individual foi realizada com o objetivo de traçar o perfil sócio-acadêmico dos sujeitos e assim compreender suas atitudes perante os encontros realizados durante a investigação. A entrevista coletiva foi realizada no final da pesquisa, a fim de extrair a apreciação dos sujeitos sobre a experiência
realizada.
É possível realizar a triangulação, utilizando-se mais de um procedimento para a obtenção dos dados. Optou-se por realizar uma triangulação, confrontando os dados obtidos pela pesquisadora, que desenvolveu uma investigação sobre a própria prática docente, com os dados obtidos pelos alunos. Isso ocorreu devido à opção de propor uma metodologia interativa, em que o professor e os alunos são responsáveis pela aprendizagem. Alves-Mazzotti (1999) destaca que uma forma de aumentar a credibili-
dade de uma pesquisa de abordagem qualitativa é triangular os dados, salientando a importância de diferentes procedimentos para a obtenção de dados. Já para Araújo e Borba (2004, pp. 35, 36):
“[...] Triangulação em pesquisa qualitativa consiste na utilização de vários e distintos procedimentos para a obtenção dos dados. Os principais tipos de triangulação são a de fontes e a de métodos. Quando checamos,
por exemplo, as informações obtidas em uma entrevista com as atas de uma reunião sobre um mesmo assunto, estamos fazendo uma triangulação de fontes. Por outro lado, se observarmos o trabalho de um grupo de alunos e depois entrevistarmos seus componentes sobre o trabalho desenvolvido, realizamos uma
triangulação de métodos. Fazendo assim, o pesquisador, ao invés de construir suas conclusões a partir de observações, pode utilizar as entrevistas para checar algum detalhe ou para compreender melhor algum fato ocorrido durante as observações, promovendo uma maior credibilidade de sua pesquisa”.
Com o propósito de encaminhar o trabalho em sala de aula, seguiram-se as etapas da modela-gem matemática descritas por Burak (2004), que são: escolha do tema; pesquisa exploratória; levantamento dos problemas; resolução do(s) problemas e desenvolvimento da Matemática relacionada ao tema; análise crítica da(s) solução(ões). Durante todo o processo, as pesquisadoras valeram-se da observação participante para acompanhar o andamento do trabalho em sala de aula, das progressões individuais e dos grupos e suas dificuldades.
Ações da pesquisa Para compreender as atitudes e posicionamentos dos sujeitos nos encontros realizados durante a pesquisa, foi realizada uma entrevista individual no início do semestre com o objetivo de traçar o perfil sócio-acadêmico do aluno. A entrevista constou das seguintes perguntas: idade; escolaridade do pai e da mãe; se
cursou o ensino fundamental e médio em escola pública ou privada e em quanto tempo; se repetiu alguma série; qual a cidade que reside; quantas horas viaja para estudar; se exerce função remunerada e quantas horas diárias trabalha; qual a renda e se dispõe de auxilio da família; se tem computador e internet em casa e o tipo de acesso (discada ou banda larga). Também foi perguntado, por que escolheu o curso de
licenciatura em matemática; quais as disciplinas que gostou mais ou menos e por quê; se reprovou em alguma disciplina e por quê; quais as atividades matemáticas que lhe despertam maior interesse; quando acredita que aprende; como deveriam ser trabalhados os conteúdos de matemática; qual a opinião sobre trabalhar em grupo; se a matemática é uma área difícil; o que é ser um bom professor; se possui alguma
experiência no magistério; quais as dificuldades e facilidades de ser professor; quais as atividades que despertam maior interesse e quando pensam que os alunos aprendem.
A idade dos sujeitos da pesquisa variou entre vinte e trinta anos. A resposta da maioria dos alunos sobre o grau de instrução do pai foi ensino fundamental incompleto, com exceção de um, que o pai tinha iniciado o curso superior. A resposta para o grau de instrução da mãe, para a metade dos alunos, foi
também o ensino fundamental incompleto e para os demais alunos, o ensino médio incompleto, ensino médio ou superior. Todos os alunos cursaram o ensino fundamental em escola pública e somente um repetiu um ano escolar. Cursaram o ensino médio também em escola pública, com exceção de um aluno que estudou em escola particular. Com exceção de um aluno todos se deslocaram para Santa Maria para cursar a faculdade. Alguns alunos (33%) viajam de duas a três horas por dia para frequentar as aulas. Excluídos os bolsistas e monitores, alguns alunos (33%) exercem função remunerada, com carga horária de quarenta horas semanais e a metade necessita do auxílio da família para manter-se na faculdade. Alguns (66%) possuem computador em casa e destes a metade dispõe de Internet em casa e somente um afirmou que possuía conexão rápida.
As outras questões referiram-se à opinião dos alunos em aspectos considerados importantes para o desenvolvimento da pesquisa. A primeira questão formulada refere-se ao motivo que o levou a escolher o curso de Matemática. A maioria dos alunos (83%) considerou o gosto pela disciplina, afinidade e facilidade manifestada durante a educação básica. Outros pontos destacados foram a questão ligada ao mercado de trabalho, a facilidade de obter emprego (33%), e somente um aluno falou que o motivo era o desejo de ser professor. Alguns alunos citaram mais de um motivo que os levou a escolher o Curso de Matemática. Esperava-se que o desejo de ser professor num curso de licenciatura representasse a opinião da maioria dos entrevistados.
A segunda questão referiu-se às disciplinas do Curso de Matemática que mais gostaram e por quê. Um aluno, respondeu que gostou de todas as disciplinas, porque tem sempre alguma coisa diferente que cativa. A disciplina preferida pelos alunos (67%) foi Cálculo Diferencial, por não ser abstrato e por ser base para outras disciplinas. Alguns alunos (17%) citaram a Álgebra por estar relacionada a situações do cotidiano. Transcrevo parte da fala de um aluno ao justificar por que gosta da disciplina de Álgebra:
“[...] é possível trabalhar muitas coisas. Fiz um trabalho sobre genética.” (Eva).
Na terceira questão indagou-se sobre quais disciplinas os alunos gostavam menos e por quê. Um dos sujeitos respondeu que não havia disciplinas que não gostasse, pois, segundo ele, sempre se aprende algo novo. Álgebra Linear foi a disciplina citada por alguns entrevistados (33%) e como justificativa: que é abstrata e que o aluno deve saber fazer demonstrações.
Na quarta questão indagou-se sobre a reprovação que se fez presente para a minoria dos entrevistados (33%), sendo que não houve disciplina em que mais de um aluno reprovasse. A quinta questão relacionou-se com as atividades matemáticas que lhes despertaram maior interesse. Para alguns alunos (33%) são as que envolvem atividades concretas. Atividades práticas, exercícios, cálculos, trabalhos, apresentação de trabalhos e uso do computador também foram citadas.
Transcreve-se parte da fala de duas alunas que descrevem as atividades que lhes despertaram maior interesse:
“[...] trabalhar com material concreto nas aulas de Estágio e computador (maple, matlab) nas aulas de Cálculos”. (Ana).
“[...] além das aulas expositivas, quando começava explicando os fenômenos do dia-a-dia era atrativo nas aulas de Cálculo”. (Vania).
Na sexta questão perguntou-se como eles pensam que os alunos aprendem. A metade dos alunos acredita que os alunos aprendem quando conseguem ensinar a outra pessoa. Além disso, outros (33%), quando se lembram do que estudaram e um sujeito relatou que aprender é estudar sozinho. A metade dos alunos acredita que a aprendizagem está relacionada ao ato de ensinar alguém. Segundo eles, aprendem enquanto ensinam e interagem com outra pessoa e, desta forma, fazem o papel de mediador e, no esforço
de tentar explicar, esclarecem-se a si próprio. Aprendem na relação com o outro. Bisognin, Bisognin e Rays (2004), ao discutirem as competências cognitivas básicas à aprendizagem de matemática salientam que uma das melhores formas de aprender é aprender a ensinar.
A sétima questão referiu-se a como deveriam ser trabalhados os conteúdos de Matemática. Um dos sujeitos da pesquisa referiu-se a que a melhor forma é o ensino tradicional ministrado com aulas expositivas e uma listagem de exercícios para serem resolvidos, além da adoção de um livro didático que permite o desenvolvimento de conteúdos matemáticos de forma linear e sequencial, citando as atividades
que poderiam ser desenvolvidas. Destaca-se o fato, de que um terço dos sujeitos gostaria que os conteúdos de matemática do curso estivessem relacionados com os da educação básica, o que, segundo eles, não está acontecendo. Transcrevem-se algumas fala dos alunos:
“[...] acho que deveriam trabalhar mais o conteúdo que vamos usar para o aluno nas escolas. Na faculdade eu sinto falta, muita falta desses conteúdos. Vou ter que explicar conteúdos que não vi na faculdade, não me lembro e não sei [...]. Assim tenho uma visão mais ampla da matemática do que um aluno do ensino médio,
mas vou ter que estudar muito, tenho uma base pelas aulas particulares que dou”. (Eva).
“[...] fazer o intercâmbio entre o ensino superior e o médio. Os professores não realizam esse intercâmbio na faculdade”. (Vania).
Outro aluno cita algumas estratégias que acredita que poderiam melhorar a aprendizagem em aulas expositivas. Pelas falas, observou-se que a maioria dos pesquisados não acredita em aulas sem alguma estratégia que inove a forma de ensinar Matemática. Pela riqueza das falas, transcrevem-se três opiniões sobre como trabalhar os conteúdos de matemática, segundo os sujeitos da pesquisa:
“[...] devem ser com material concreto, em algumas aulas. Promover discussão entre colegas e utilizar calculadoras e computador”. (Ana).
“[...] de acordo com o meio, avaliar a turma. Isso é complicado. A realidade do curso é uma e na escola que faço estágio é outra. A escola dispõe de uma sala de aula com quadro e giz e tem que motivar os alunos para a aprendizagem”. (Roberto).
“[...] além das aulas expositivas acredito que trabalhar envolvendo a realidade. Levar o conteúdo para a realidade é significativo para o aprendizado”. (Vania).
A oitava questão estava relacionada com a opinião dos alunos sobre trabalhos em grupo. A maioria (83%) posicionou-se favorável aos trabalhos em grupo, somente um dos alunos posicionou-se não muito favorável pelo fato de depender dos componentes do grupo e argumentou levar a sério os trabalhos e por isso, às vezes, tem dificuldade de produzir com trabalhos coletivos, mas gosta da troca de idéias que o
trabalho em grupo oferece. Na opinião dos alunos que foram favoráveis:
“[...] é significante para o aprendizado interagir com os colegas”. (Vania).
“[...] gosto de trabalhar em grupo, discutir idéias, montar o trabalho. São visões diferentes e é bom”. (Lia).
“[...] é importante porque aprendemos a conversar uns com os outros, avaliar-se e avaliar o colega, comunicarse com o outro, conversar e saber o que vai dizer”. (Eva). “[...] gosto de trabalhar em grupos. Em pequenos grupos o rendimento é melhor. A troca de idéias é válida”. (Diana).
Na opinião do aluno Roberto trabalhar em grupo:
“[...] é importante, aprende-se a falar. Desenvolve a capacidade de manifestar-se. Hoje, para exercer qualquer profissão, saber se comunicar com as outras pessoas é primordial. Quem tem dificuldades de falar, ao trabalhar em grupo começa a se libertar, conversar, ficar mais a vontade. Conheço professores que se tivessem desenvolvido trabalhos em grupo teriam aprimorado a comunicação, professor que domina o conteúdo, mas chega em frente de um grupo e tem dificuldade para se expresar”.
Ao serem indagados sobre o que é ser bom professor de Matemática a maioria dos alunos opinou que é aquele que consegue transmitir o conteúdo. Todos tinham bons argumentos para iniciar a conceituar o que é ser bom professor e relacionaram-no ao fato de saber ensinar. Percebeu-se, pelas respostas, que não existia um padrão nas definições. A opinião de Ana sobre o que é ser bom profesor:
“[...] acredito que é conseguir transmitir de forma que o aluno consiga ver que aprendeu, que está relacionado com a vida deles não só fazer conta e conta”.
A aluna Vania refere-se às teorias adquiridas no curso superior e as relaciona com sua prática escolar no estágio; as outras duas alunas se manifestam sobre a aprendizagem dos alunos:
“[...] conseguir que o aluno entenda o que está aprendendo e não simplesmente memorize. Com a aprendizagem me preocupo, penso nisso quando preparo aula. Não basta saber, tem que fazer. Não dá para escrever sobre a aprendizagem significativa e não fazer.” (Vania).
“[...] saber passar o conteúdo porque não importa se o professor sabe, tem que saber passar para o aluno.” (Lia).
“[...] conseguir transmitir de diversas maneiras o conteúdo de forma que os alunos aprendam”. (Eva).
No primeiro encontro, a professora responsável pela disciplina apresentou o Plano de Ensino e discutiu com os alunos sobre as atividades que seriam desenvolvidas. Desta forma, pretendia-se seguir a ideia lançada por Masetto (2001) que o propósito do primeiro encontro é esclarecer que o sucesso da disciplina depende de um trabalho conjunto entre alunos e professores.
De imediato percebeu-se que o trabalho seria um desafio. A resistência quanto à forma de trabalho apareceu desde o primeiro encontro. Os alunos perguntaram se seriam avaliados por prova, como seria realizada a avaliação, se teriam aulas expositivas, qual o livro didático que seria adotado, se teriam listas de
exercícios semanais e se valiam como nota. Na verdade não entenderam a dimensão do trabalho que seria realizado porque não fazia parte da sua rotina.
Iniciou-se o trabalho com leitura e discussão de artigos sobre Modelagem Matemática que descrevem as tendências e experiências realizadas por pesquisadores em diferentes níveis de ensino. Este estudo inicial foi fundamental para se entender as concepções que existem sobre Modelagem Matemática e
também, por permitir uma reflexão sobre sua adoção em sala de aula e qual é o papel do professor em atividades com modelagem.
No relato dos alunos foram apontadas as seguintes dificuldades quanto à forma de trabalho:
a) Dificuldade de trabalhar em grupos.
b) Falta de hábito de leitura e discussão de textos.
c) Não utilização de um único livro didático a ser seguido.
d) Abandono das aulas expositivas e sequenciadas.
e) Insegurança quanto à forma de trabalho.
Muitos dos questionamentos feitos pelos alunos durante as discussões dos textos consistiam em dúvidas que nós, professoras, também tínhamos. Os alunos questionaram: “Afinal, com o trabalho com a modelagem matemática o professor não pode trabalhar sozinho e deve interagir com outros colegas de
outras disciplinas e como fazer isso? Como trabalhar com turmas de 30 ou mais alunos? E como trabalhar com esta metodologia se a escola possui um programa que obrigatoriamente deve ser seguido?”. Nas discussões e depoimentos dos alunos ficou claro que a resistência tinha como origem a falta de vivência com uma experiência que envolvesse essa metodologia de trabalho e a insegurança quanto a
essa forma de trabalhar. Os alunos foram orientados para que, em grupos, definissem um tema de interesse. Esse foi um momento de grande negociação e, ao mesmo tempo, em que as resistências em relação à metodologia detrabalho tornaram-se muito evidentes. Observou-se, em todos os grupos, a manifestação explícita de que a
forma de trabalhar os incomodava e que sentiam falta de aulas expositivas, das listagens de exercícios.
Desde o início do trabalho os alunos sentiram-se desestabilizados e a tendência foi proporem o retorno ao trabalho tradicional e confortável, no qual o professor explica o conteúdo e os alunos assistem passivamente à exposição.
Apesar das dificuldades encontradas, os grupos definiram temas como: maconha, transporte urbano de Santa Maria, carro movido a bicombustível e a criação de chinchilas. A partir do estabelecimento do tema, os alunos foram orientados para a elaboração do projeto a ser desenvolvido. Nessa etapa, o papel do professor foi fundamental, pois, por meio de questionamentos sobre cada tema, os alunos conseguiram definir um problema a ser investigado.
Superada essa fase, os grupos responsabilizaram-se pela coleta de informações e dados quantitativos e qualitativos, o que lhes permitiu compreenderem cada tema proposto. A partir da coleta de dados, os grupos foram encorajados a criarem situações-problema para tentarem responder ao problema investigado. Nesta etapa, apareceu uma nova dificuldade: a elaboração de uma situação-problema, a partir
de determinados dados de forma concisa e clara. A dificuldade está relacionada com o fato de os alunos não terem o hábito de criarem problemas, mas apenas o de resolverem problemas prontos encontrados nos livros didáticos.
O grupo que trabalhou com o tema maconha teve como preocupação analisar a concentração da droga que permanece no organismo humano, em usuários crônicos, com o passar do tempo, e analisar as consequências para os usuários. O grupo que trabalhou com o transporte urbano questionou o impacto do aumento da tarifa de ônibus na renda dos usuários e quais melhorias, quanto aos serviços, poderiam ser oferecidas para a população por meio do lucro obtido com o aumento da tarifa; o terceiro grupo trabalhou com o carro movido a bicombustível e questionou: quando se deve usar gasolina ou álcool; o grupo que trabalhou com a criação de chinchilas analisou várias situações-problema, envolvendo o crescimento populacional, o tamanho da família inicial para investimento e qual deve ser o melhor momento de venda
dos animais a fim de se obter o máximo lucro.
A ação pedagógica do professor que desenvolve atividades com modelagem matemática necessita de uma mobilização que encoraje e instigue os alunos, por isso, durante o desenvolvimento desta pesquisa, a ação pedagógica embasou-se em Ferruzzi (2004), que descreve as seguintes orientações para o professor que pretende seguir as atividades de Modelagem Matemática.
“[...] o professor deve comportar-se como um orientador, como um coordenador das atividades, tentando solucionar as dúvidas dos alunos, intervir quanto solicitado e recomendar bibliografias que possam auxiliar os alunos, comportando-se assim como um norteador de idéias. É importante que os alunos reflitam sobre o seu trabalho. Assim, o professor não deve responder diretamente as questões, mas sim, usar questões que os incentivem a refletir sobre o seu desenvolvimento. É importante também que os alunos sejam incentivados a justificar seus procedimentos e que explicitem matematicamente suas conclusões, para que assim, reflitam
sobre o seu próprio trabalho. Assim, a atitude do professor visa a orientação dos trabalhos, oferecendo apoio, provocando discussões, realizando ligações entre o conhecimento do aluno e os conteúdos a serem apresentados”. (2004, p. 11).
É sugestiva a fala de um aluno quando diz:
“[...] Está difícil pensar professoras, vocês fazem muitas perguntas. Nós vamos voltar para casa com dúvidas”.
(Diana). (Registro de parte da fala de uma aluna no Diário de Campo da Pesquisadora).
O grupo que pesquisou sobre maconha, conforme investigava sobre o assunto, elaborou as situações-problema. Os dados e informações obtidos permitiram que o grupo desenvolvesse o conteúdo de equações lineares de diferenças, além de construírem tabelas e gráficos, utilizando programas computacionais como o Excel, Maple, CurveExpert e Winfin. Por ser um assunto com várias informações numéricas,
muitas vezes contraditórias, foi um tema propício para desenvolver equações de diferenças, cujo conteúdo os alunos não tinham conhecimento. Assim, a partir das situações-problema criadas foi possível introduzir conteúdos novos. Os alunos estavam motivados para buscarem este novo conhecimento, ois surgiu
associado a um problema social que eles estavam interessados em estudar.
O grupo que pesquisou sobre transportes urbanos, estudou alguns conteúdos de matemática financeira como, porcentagem, taxas, juros e série de pagamentos, além de equações lineares, logarítmicas, progressões e equações de diferenças de primeira ordem. Esse tema foi recorrente nos meios de comunicação da cidade e envolveu interesses de setores distintos como, a organização dos estudantes, empresários do ramo, economistas e prefeitura municipal. Cada setor divulgou seus dados e ustificativas, o que permitiu que os conteúdos de matemática financeira fossem aplicados e os resultados analisados sob diferentes olhares. Os dados divulgados de cada setor permitiram que o grupo criasse diferentes modelos e os validassem, levando em consideração os interesses de cada um deles, permitindo uma reflexão
profunda, além de fortes discussões e comparações dos diferentes planos de aumento da passagem. O grupo que estudou sobre carros movidos a bicombustíveis não teve uma presença muito constante, pois era formado por um grupo de alunos que trabalhavam, mas mesmo assim, o grupo continuou a se comunicar com as professoras via Internet. A equipe conseguiu produzir um artigo de qualidade e foi o grupo mais preocupado pela aplicação dos conteúdos como futuros professores. As situações-problema criadas envolveram os conteúdos sobre proporcionalidade, funções lineares e porcen-
tagem. Esses conteúdos eram conhecidos dos alunos que decidiram propor um projeto, o qual poderia ser aplicado aos seus futuros alunos.
O grupo que investigou sobre criação de chinchilas explorou o crescimento de uma família de animais e, com os dados obtidos, conseguiu propor situações-problema que envolveram o estudo da sequência de Fibonacci, sequências numéricas e equações de diferenças de segunda ordem lineares. A partir dos modelos construídos, os alunos analisaram o crescimento e decrescimento da população e conseguiram resultados significativos em relação à estabilidade da família dos animais. As situações-
problema surgiram de forma natural e foram decorrentes das atividades desenvolvidas, bem como permitiram a construção de conceitos matemáticos novos a partir das investigações realizadas, sem prévias definições.
Após terem conseguido elaborar uma situação-problema, resolvê-la, encontrar o modelo matemático e validá-lo, os alunos motivaram-se com o trabalho. A partir deste momento os grupos conseguiram elaborar novas situações-problema e ocorreram trocas valiosas de conhecimento entre os grupos e as professoras, devido ao amadurecimento dos envolvidos no contexto.
Os alunos perceberam-se e instituíram-se como grupo, estabelecendo uma relação de confiança mútua e de troca de experiências. Houve, dessa forma, um trabalho de colaboração entre os componentes dos grupos e dos grupos entre si. Conforme Masetto (2001), as atividades desenvolvidas em grupo deixam contribuições significativas e mais avançadas que as individuais. O fato de os alunos tomarem conheci-
mento das colaborações dos outros, discutirem, analisarem e debaterem entre si e com as professoras permitiu o rompimento das amarras do individualismo e construiu-se um ambiente favorável à aprendizagem.
Após a superação da fase de elaboração de situações-problema, de solução e análise dos resultados, os grupos iniciaram a escrita do trabalho, pois foi esta a proposta inicial constante no Plano de Ensino da professora responsável pela disciplina e que também fazia parte da avaliação dos alunos. A escritura do trabalho foi a fase de maior preocupação do grupo, pois redigir um artigo exige estudo e dedicação. Acredita-se que os alunos sentiram-se apreensivos porque escrever um trabalho científico não fazia parte da rotina do curso de graduação.
Neste momento, retomaram as leituras de artigos referentes a resultados de pesquisas, envolvendo o uso da modelagem matemática. Verificou-se que este foi um ponto gratificante de vivenciar, como professoras, pois os alunos perceberam o quanto os professores de matemática têm dificuldades de escrita.
Ao perceberem isso, eles se dedicaram e conseguiram escrever um artigo com clareza de linguagem, bem como demonstraram o domínio do tema e dos conteúdos matemáticos abordados. Descreveram as dificuldades e facilidades que a metodologia da modelagem matemática lhes propiciou. Conseguiram estabelecer relações entre conteúdos matemáticos e os temas por eles abordados, promovendo, desta forma, a contextualização desses conteúdos num processo criativo e reflexivo. Concorda-se com Masetto (2001) que redigir um artigo é uma atividade que auxilia a aprender a comunicar-se por escrito sobre seus conhecimentos de forma sintética, lógica, coerente e com argumentos para fundamentar suas posições.
A mudança de comportamento inicial dos alunos foi surpreendente. De acordo com seus
depoimentos, pode-se citar: o envolvimento com o trabalho que ocorreu durante as aulas da disciplina, bem como fora da sala de aula, a investigação de temas de seus interesses, a realização de atividades fora dos horários previstos para os encontros, as correspondências eletrônicas entre professoras e alunos e entre os
próprios alunos, entre outros.
Após o término dos encontros, foi realizada a entrevista coletiva no intuito de obter a opinião do aluno de Licenciatura em Matemática, participante da pesquisa, sobre as atividades desenvolvidas. Os estudantes opinaram sobre a metodologia utilizada nas aulas da disciplina, sobre a importância do trabalho, se adotariam a mesma forma de trabalhar nas suas aulas como futuros professores e como
avaliam as atitudes e as atividades desenvolvidas pelas professoras em sala de aula. Todos os alunos opinaram positivamente sobre a metodologia utilizada, principalmente, por ela despertar o gosto e o interesse pela matemática. Argumentaram que se sentiram livres quanto à matemática a ser trabalhada e
que não foram forçados a estudar este ou aquele conteúdo. Nesse sentido, as vozes dos sujeitos da pesquisa convergem para os achados de Burak (1987, p. 32):
“No estudo da matemática através da modelagem, as atividades se constituem na ação de refletir, de fazer, de construir, de concluir e de generalizar. Esta é a liberdade que essa prática educativa parece permitir a cada participante do processo, ao favorecer o uso de suas próprias estratégias, na sua maneira natural de pensar, sentir e agir”.
Em nenhum momento os alunos classificaram a modelagem matemática como algo fácil, pelo contrário, acreditaram ser trabalhosa para o aluno e para o professor. Argumentaram que se sentiram responsáveis pelas aulas, necessitaram pensar o que iam fazer, mas, possuíam clareza do que fazer e, por isso, se sentiam comprometidos com a aprendizagem, pois perceberam que o trabalho dependia deles e não só do professor. É sugestiva a fala dos alunos durante a entrevista coletiva.
“[...] é muito trabalhoso. Nós tínhamos que fazer, nós tínhamos que correr atrás...” (Vania).
“[...] tínhamos que fazer. Se eu faltasse o meu trabalho ia ficar parado”. (Ana).
Acreditaram que a modelagem matemática é uma alternativa pedagógica que propicia o gosto pela Matemática. Eles também acreditam que se essa metodologia fosse utilizada, mesmo que só em algumas aulas, em outras disciplinas do curso, os alunos sentir-se-iam mais seguros de si e como futuros profissionais.
Os resultados desta pesquisa permitiram que as pesquisadoras comprovassem as afirmações de Barbosa (2001b) sobre as vantagens do uso da modelagem em sala de aula. Segundo o autor, esta metodologia propicia a compreensão dos conteúdos matemáticos; o desenvolvimento de habilidades de pesquisa; a significação das atividades escolares; o envolvimento dos alunos e do professor e a criação
de um ambiente favorável à aprendizagem. Os alunos participantes desta pesquisa demonstraram características idênticas às encontradas por Blum, apud Barbosa (2003) e Bassanezi, apud Barbosa (2004b) que são: motivação, facilitação da aprendizagem, aplicação da matemática em diversas situações, desenvolvimento de habilidades para a investigação e compreensão do papel sociocultural da Matemática. Tendo em vista a opinião desses autores e a natureza da pesquisa, optou-se por realizar a
triangulação de fontes, dando maior credibilidade à pesquisa. Para isso, utilizaram-se as observações participantes registradas no Diário de Campo da pesquisadora, registros nos Diários de Campo dos sujeitos participantes, documentos dos estudantes e entrevistas semi-estruturadas, individuais e coletiva.